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Este artigo foi escrito por Ralf Zimmer Júnior, Defensor Público do Estado de Santa Catarina e autor do Impeachment contra o governador de Santa Catarina, Carlos Moises.
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Paralelo à pandemia tem sido lugar comum a desinformação, as polêmicas e a busca de capitalização política sobre a catástrofe.
Manifestações decotadas, descontextualizadas com pitadas de oportunismo tem sido munição para o saco de maldades de patrulhas digitais das mais variadas matizes.
Ataca-se medicações, vacinas, falta de produtos hospitalares não sem antes “linká-los” a algum político, gestor, que se é desafeto.
Fato é que não se vislumbra relação de nexo causal direto e imediato de condutas descritas na Lei do Crime de Responsabilidade (impeachment) a ser imputadas com justa causa segura nem à Dória, muito menos a Bolsonaro.
A vacina Coronavac foi uma aposta no meio da pandemia mundial para que o Brasil produzisse o imunizante. Contudo, conquanto desanimador o anúncio da baixa percentagem que as pesquisas revelaram para fins de imunização, girando em torno de 50%, não se vislumbra malversação com o dinheiro público, tampouco, repita-se, conduta descrita como crime de responsabilidade na Lei de impedimento. Gostar ou não de Dória é uma coisa, querer seu impedimento é outra, totalmente injustificável ao menos no momento.
Em relação ao Presidente Jair Bolsonaro, malgrado suas declarações por vezes polêmicas, e “não-politicamente-corretas”, gostando ou não delas ou dele, é uma falta de conhecimento ou covardia da pior espécie querer responsabiliza-lo pelas mortes causadas pelo Coronavírus, quanto mais querer impichá-lo por isso.
Primeiro, porque a saúde é obrigação solidária de Municípios, Estados e União.
Segundo, porque independente das opiniões do Presidente, praticamente todas as medidas de revelo em combate à pandemia foram ajuizadas, sendo que os Tribunais Superiores deram o tom sobre elas, não sem antes caírem em suas contradições inexplicáveis. Ora, entenderam toque de recolher como inconstitucional, ora tergiversaram e liberaram medidas envoltas em eufemismo que traz em seu bojo o que já foi proibido e agora não o é, sem que fizessem sequer uma “meia culpa” expressa, que seria o mínimo (fundamentação para justificar mudança de entendimento).
Nessa ordem de ideais, o STF, bom lembrar, autorizou os Estados e Municípios, adquirirem, independente de prévia aprovação da ANVISA acaso descumpra prazos, imunizantes em uso no exterior.
O Presidente da República, por sua vez, editou medida provisória dando caráter de urgência à atuação da ANVISA no ponto referente às vacinas, e seu governo buscou atender a população com o auxílio emergencial (política ampla de ajuda financeira direta às camadas mais necessitadas da sociedade).
Não bastasse isso, a União liberou no intermeio da pandemia pacotes milionários aos Estados da Federação, donde alguns gestores se viram envoltos em compras fraudulentas de ventiladores intermediados por casa de vinhos (Amazonas) ou por casa de meretrício do subúrbio carioca (Santa Catarina).
Em contrapartida, não há um Ministério sequer do Governo Federal sob investigação de eventual crime de corrupção, o que é uma novidade nos últimos 20 anos no mínimo, o que não significa dizer que todos são “uma Brastemp”.
Quanto à política de vacinação como um todo, há atraso sim do Brasil em relação aos demais países, como há dos Estados e Municípios (liberados antes do Natal pelo STF para agirem como dito acima), e isso tem custado vidas.
A questão das agulhas e seringas, enquanto não há vacinas, não possuem nexo causal (a não ser se demonstrada ser essa a causa dos atrasos das vacinas, o que não o foi!) a responsabilizar, por ora, agente público algum.
Volvendo às vacinas em atraso, a cadeia de comando é clara, se há algum responsável, e sempre há, deve-se inicialmente se centrar os questionamentos nas pastas responsáveis, Secretarias de Saúde dos Estados e Municípios, e Ministério da Saúde em âmbito Nacional.
Contudo, o órgão precípuo na esfera criminal (que é totalmente independe dos ditos crimes de responsabilidade, impeachment, que será tratado abaixo) para buscar responsabilização é o Ministério Público, que antes de ajuizar eventual demanda exigindo a obrigação de fazer prevista na Lei de Ação Civil Pública para que sejam feitas efetivamente as vacinações não gozará de legitimidade para avançar na seara criminal no ponto.
O crime de responsabilidade, embora de natureza jurídica controvertida (criminal e política, ou, ainda, administrativo-criminal, etc.), exige em todas as condutas descritas na lei minimamente nexo causal dentre atuação ou omissão do agente e a conduta lhe imputada. Aí que reside a impossibilidade de se ventilar eventual responsabilidade de Bolsonaro, dado que o STF mesmo, como já dito, espraiou as possibilidades (poder-dever) de outros representantes pátrios do Executivo agir na busca dos imunizantes.
Não há, por exemplo, dos fatos que acusam Bolsonaro, o registro da ligação do Presidente do Tribunal de Contas em véspera da realização de uma compra fraudulenta para não fazê-la (como teve em SC entre o Presidente do TCE e o Governador, conforme aferido na CPI “dos ventiladores” que caminha aqui infelizmente para a pizzaria…), como também não se tem notícias de ligação do Governador do Amazonas (cujo governo também está envolvido em escândalo de compras fraudulentas de ventiladores) ao Presidente da República avisando que o Oxigênio estava à deriva no Estado. Como também não há um indício que Bolsonaro teria envolvido, durante a presidência, escritório da esposa para transações ao que tudo indica ilícitas, tais quais as acusações que pesam contra Witzel (RJ).
Os problemas das paróquias devem primeiro ser resolvidos nelas, e se forem ser remetidos aos governos centrais formalmente, antes de cobrá-lo, há que se desnovelar as incompetências (e por vezes crimes) locais ou regionais.
Não, não sejamos quiçá entusiastas da Coronavac, nem fãs de João Dória. Tampouco negacionistas, e muito menos ainda a favor de ataques imbecilizantes à ciência e aos fatos.
Contudo, também não é minimamente crível ser oportunista e querer responsabilizar um Presidente da República por fatos muito mal geridos antes de tudo nos próprios Estados em que estão a ocorrer.
Um pouco de senso crítico, desprovido de paixões políticas, bem denota que, nada obstante o clima desesperador envolto aos resultados até então nada animadores da gestão da crise da pandemia em todos os âmbitos (municipais, estaduais e Federal), não há (ao menos pelos fatos até então noticiados) falar de impeachments por ora nem de João Dória, muito menos de Jair Bolsonaro.
Há que se cobrar sim, entretanto, que não se vá às calendas os processos de impedimento já abertos que tenham, a tempo e modo um desfecho, tais quais no Rio de Janeiro e Santa Catarina, até lá os parlamentares destes Estados não terão envergadura moral alguma para cobrar responsabilização na seara do impedimento em outras Unidades Federativas, muito menos do Presidente da República.